terça-feira, julho 11, 2006

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A rua franziu-se de luz intensa e pálida, e o negrume baço tremeu, de leste a oeste do mundo, com um estrondo feito de escangalhamentos ecoantes ... A tristeza dura da chuva bruta piorou o ar negro de intensidade feia. Frio, morno, quente - tudo ao mesmo tempo -, o ar em toda a parte era errado. E, a seguir, pela ampla sala uma cunha de luz metálica abriu brecha nos repousos dos corpos humanos, e, como o sobressalto gelado, um pedregulho de som bateu em toda a parte, esfacelando-se com silêncio duro. O som da chuva diminui como uma voz de menos peso. O ruído das ruas diminui angustiantemente. Nova luz, de um amarelado rápido, tolda o negrume surdo, mas houve agora uma respiração possível antes que o punho do som trémulo ecoasse súbito doutro ponto; como uma despedida zangada, a trovoada começava a aqui não estar.

... com um sussurro arrastado e findo, sem luz na luz que aumentava, o tremor da trovoada acalmava nos largos longes - rodava em Almada ...

PESSOA, Fernando, "O Livro do Desassossego", Novis, Lisboa, 2000, p.148/149

3 Comments:

Blogger wind said...

Adoro este livro. O mais estranho é que quando comecei a ler, pensei por segundos que era algo escrito por ti:)
beijos

5:12 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Obrigada pelas palavras sempre bonitas que deixas nas minhas romãs. A música é escolhida pelo Friedrich, e é linda,concordo contigo. Quanto a Fernando Pessoa, não o comento. Beijos.

7:24 da tarde  
Blogger lena said...

um livro que não me canso de ler, adoro

Fernando Pessoa o mestre que tanto me diz

um beijo meu Dulce

10:42 da tarde  

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