terça-feira, outubro 02, 2007

na vidraça


hoje à tarde choveu. muito . sentada à secretária deixei-me prender pelo chamado da chuva a cair. não escorria pela vidraça. o vento não estava de feição ou nem sequer havia vento. caía a direito. determinada. como num percurso previsto desde sempre. interpunha-se entre mim e os prédios tristes que encaro diariamente. distorcia as fachadas. desenhava-as de novo em contornos novos e surrealistas. e eu perdia-me entre o ecrã e a vidraça. entre a vidraça e o teclado. perdida entre a chuva que caía a direito e os pensamentos que se perdiam por caminhos nebulosos e poeirentos. hoje à tarde choveu. muito. não tanto como ontem choveu em mim. nem tão a direito como os pensamentos que ontem me derrubaram. por vezes a chuva é tanta dentro de mim que não me deixa ver o caminho e atolada não consigo prosseguir. apenas esbraçejo num pântano que me cega e tolhe. apenas morro num presente que cala o futuro. sobrevivo nesses dias na esperança de que o sono me leve. me presenteie com um dia novo. sento-me muito quieta no sofá do escritório e ali fico. como antes se dizia à espera que a crise passe. o dia vai caindo a pouco e pouco. a luz decrescendo. as sombras ganhando o espaço. os gatos adivinhando-me, sentam-se ao meu colo. rodeiam-me. olham-me com os olhos da alma. sentirão talvez. quem sabe o que sentem? sentirão em mim a desesperança desses dias pantanosos? sentem e calam o que reflicto. abraçam-me com a sua presença junto a mim. até que a noite apaga todos os contornos. até que eu consiga respirar de novo. hoje choveu. muito. depois as nuvens dissiparam-se e o sol fez evaporar as lágrimas que o céu verteu. sentada à secretária, perdida entre o teclado e o ecrã. entre a vidraça e os pensamentos. deixei apenas que o sol ganhasse o espaço. em mim também.
(Foto, minha)

27 Comments:

Blogger Licínia Quitério said...

Muito obrigada pela tua visita.

A chuva também serve para lavar. Lá fora e cá dentro.
E os gatos são presenças tão cheias de sol!

Beijinho.

9:13 da manhã  
Blogger Teté said...

Nem que seja só por causa dos gatos, Dulce!

Gostei muito do texto, triste e cinzento (na perspectiva outonal?), espero que o Sol te ilumine, apesar das núvens...

Jinhos

11:12 da manhã  
Blogger Kalinka said...

OL� DULCE

O gato est� a fixar algo atrav�s da vidra�a. Que fofo!!!

N�o sei se leste, continuo com o alfabeto, mas a letra F teve que ser feita por 2 x, e um segredo s� para n�s: n�o terminei com as palavras todas que encontrei na minha mem�ria, ser� que fica mal fazer uma 3� parte?
Por vezes penso que estou a cansar quem me visita e l�...

Beijokitas.
Um �ptimo fim de semana prolongado.

1:35 da tarde  
Blogger Flôr said...

O sol continuará a ganhar espaço em ti, só é preciso que as nuvens se dissipem.

Gostei do teu amigo. Tem um ar muito meigo.

Beijitos

5:00 da tarde  
Blogger Cusco said...

Olá! E pronto..mais um belo texto, dentro de um estilo que eu aprecio imenso!
Beijo!

6:21 da tarde  
Blogger A. Jorge said...

Um texto lindíssimo, mas... Tanta tristeza, Dulce! Tanta tristeza que para aí vai!...
Não vou ter o atrevimento de te perguntar o que se passa mas... dentro das minhas limitações (que são muitas)se te puder ajudar nalguma coisa, não te acanhes!
Lembra-te que "não há mal que sempre dure..."

Abraço

Jorge

http://vagabundices.wordpress.com/

6:22 da tarde  
Blogger margusta said...

Dulce,
..Hoje venho só deixar um beijinho Grande...
amanhã volto para te ler...

10:50 da tarde  
Blogger sOl said...

Muito lindo o texto..
E o miau,tão lindo!!Tão parecido com o meu Big! =p
Amo miaus =) Tenho 5 xD
Lindo o blog...



sOl*

10:51 da tarde  
Blogger mfc said...

Deixa o sol ganhar o seu lugar... ele merece-o, por ti!

11:05 da tarde  
Blogger Mariamar said...

olha... para tristezas basto eu... Vê que até num céu cinzento, na chuva, há beleza... Faz tudo parte de um todo! E eu sempre disse, assim como aos miúdos e até a mim mesma, que as lágrimas lavam a alma e a chuva purifica o ser. Há dias assim... mas não os prolongues.
Estou aqui, já sabes.
Beijinhos de todos nós. (todos)

11:13 da tarde  
Blogger Concha Pelayo/ AICA (de la Asociación Internacional de Críticos de Arte) said...

te dejo un fuerte abrazo amiga Dulce.

12:28 da manhã  
Blogger Zé-Viajante said...

A crise passa. TEM mesmo que passar.
Bjs

6:59 da manhã  
Blogger Ana Fundo said...

Vá lá moça, anima-te :-)
O texto espectacular, a Foto LINDA, o que dizer mais....deixa ver.... GOSTO DE TI :-)
Beijos
Ana

10:37 da manhã  
Blogger Rodrigo Fernandes (ex Rodrigo Rodrigues) said...

Li ainda agora a tua provocação e não pude deixar de, pressurosamente, lhe corresponder. Vim à cata do teu blog e descobri-te tetrablogger. O critério de tal arquitectura é imediatamente compreensível de modo que vim aqui além de mim deixar o recado.

A primeira impressão é a de que temos abordagens à escrita muito parecidas: uma escrita sensorial, aprisionada no momento instante, sem elocubrações metafísicas sobre o além da vida, uma projecção para além de mim, consciência que se faz carne do mundo concreto imediato em que vivemos.

Depois, esse mundo concreto é feito de gatos. No teu caso, de dois gatos domésticos que tu acolhes na tua casa; no meu caso, creio [é difícil contá-los] que nove gatos selvagens que me acolhem no terreno que, sendo juridicamente meu, é deles por usocapião. Não promovemos a "ruptura ontológica" entre estes dois modos de ser embora (con)sintamos as suas diferenças.

As semelhanças não se ficam por aqui: há os movimentos do olhar, os jogos e luz, sombra e escuridão, a dialéctica do cheio e do vazio, o pingar do instante pulsando nas veias ou no relógio cósmico, o sentido da estranheza fundador de toda a escrita emocionada e a espera ... a espera, a atitude que deixa a chave à entrada e à saída da porta que nos introduz no instante.

Vários comentários acima referem a tristeza, a cinza, as nuvens, a crise. Por amor à verdade devo dizer que não concordo. Na verdade, diz-se que os tempos sombrios das estações frias cobrem com um lençol de melancolia o carácter instável dos portugueses. Podendo haver aí algo de verdade, há mais de inverdade. O português é um sofredor fingido que tira prazer do seu sofrimento. Quando está sol, e pode esticar-se no chão à vontade, esquece-se das tristezas; quando ensombrece e não sabe que mais fazer (que trabalho não é com ele) remoi as alegrias da tristeza. É um safardanas o português. Mas não é esse o teu caso: pintas de cinza um quadro que é cinza; se negro fosse, aplicavas-lhe cores mais carregadas - é esse o mister do pintor.

E, depois, a chuva, porque carga de água há-de ser uma coisa triste? Como bem diz a Licínia Quitério, também serve para levar. E para regar, acrescento eu, que me baixa consideravelmente o tributo à EDP e o desperdício dos veios friáticos.

Gostei muito. Vou acrescentar-te à minha lista.

11:37 da manhã  
Blogger margusta said...

Amiga Dulce,
..como prometido voltei...e gostei Imenso do teu texto...um texto sentido onde me identifiquei.

Eu não tenho gatos, mas tenho um cão que não me larga um segundo, e que me olha com esses olhos da alma...parece adivinhar tudo em mim...

Beijinhos para ti e que o sol ilumine sempre os teus dias!

3:11 da tarde  
Blogger poetaeusou . . . said...

*
sentirão em mim a desesperança desses dias pantanosos?
,
não duvides, dulce
*
xi
*

5:52 da tarde  
Blogger Besnico di Roma said...

Passei, li e senti, em silêncio, sem ruído, não queria espantar o gato com o tumultuoso ruído do meu pensamento.

8:15 da tarde  
Blogger Bichodeconta said...

No silencio, com um vento que sopra baixinho. Leio-te e fico de coração apertado.. Há um desespero imenso na tua voz.. Voz que escuto na surdina deste vento.. A tua tristeza é preocupante, porque preocupantes são os estados de alma que magoam.. Vou voltar , até lá deixo um mimo, deixo um abraço, e o desejo de te sentir sorrir..

9:08 da tarde  
Blogger The Perfect Stranger said...

bom fim de semana
para si e gato ;)

12:50 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

O fascínio da chama na lareira aos nossos pés e da chuva a cair lá fora. Uma sensação misteriosa e bela. Gosto de ler o jornal no carro após uns minutos até um local apropriado , uma dose maciça de Expresso durante umas duas horas, mas se está a chover, que mundo as gotas me contam! Há lá letras desfeitas do seu isolamento e presas em palavras que o consigam dizer? Fica-me a leitura pela metade das folhas e pelo inteiro que o mar em gotas, dentro me segredou.
E há depois um sol sim. Surge da sua preguiça, ainda a bocejar. Diz que o tempo não espera e que está atrasado...

2:13 da manhã  
Blogger Paula Raposo said...

Espera-se que o dia a seguir amanheça sem nuvens e nos tire do pântano...beijos.

9:05 da manhã  
Blogger Kalinka said...

Começo por desejar um excelente Feriado.
Na minha teimosia de fazer um 3º post sobre a letra F, faço destaque a um evento – A Real Regata das Canoas 2007, que decorre hoje - dia 5 de Outubro, entre a Moita e Belém, é um evento organizado pelo Centro Náutico Moitense e a Associação Náutica Sarilhense, com o apoio da Associação Náutica do Seixal, da Associação Náutica da Marina do Parque das Nações e das Câmaras Municipais das regiões ribeirinhas do rio Tejo. Juntos voltam a dar vida a uma tradição perdida, quando os reis ordenavam a celebração de uma regata anual em homenagem aos fragateiros. Existem 42 embarcações tradicionais inscritas que, irão soltar velas ao vento e disputar o título entre a praia do Rosário, no Concelho da Moita, e o Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa. Existem alguns varinos e fragatas municipais disponíveis para embarcar aqueles que queiram assistir à Regata bem de perto. Os privilegiados soltaram amarras às 11:00 de dia 5, na porta Tejo do Parque das Nações. Mas ainda restam muitas opções para apreciar este belo evento ao ar livre. Em terra, pode assistir à saída ao ferro da Praia do Rosário, no Gaio-Rosário (concelho da Moita), às 13:00, e à chegada à meta, no Padrão dos Descobrimentos, a partir das 14:30, a que se seguirá um espectacular desfile das embarcações. Fora de pé há sempre a possibilidade de seguir em barco próprio ou apanhar boleia de um dos muitos barcos na Associação Náutica da Marina do Parque das Nações, bem como de embarcar num cacilheiro Belém-Cacilhas-Belém.
Aceitas a minha sugestão?

Beijokas.

11:55 da manhã  
Blogger Maria said...

Leio-te em silêncio e saio devagarinho...

Deixo-te um abraço

10:26 da tarde  
Blogger jorge esteves said...

Palavras sentires em tons de Outono...
Abraço.

12:31 da tarde  
Blogger wind said...

Mana!
Beijos

12:41 da tarde  
Blogger Su said...

sem palavras.....só chuva em mim

jocas maradas

psstt amei teu gato

9:35 da tarde  
Blogger APC said...

Um belíssimo instantâneo da desesperança desses dias pantanosos...
Não faz sentido falar-te disso, porque eles são pertença de quem os sente. Importa é que que se não deixe de permitir que o sol regresse, isso sim.
Todavia, que ser humano se não compadece da sua existência, pese embora a queira sua por mais tempo?
O texto, está genuinamente sentido. A fotografia, não podia ser melhor!
Um abraço! :-)

3:21 da manhã  

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