domingo, julho 30, 2006

Varandas

As varandas permitem-nos sempre observar o todo - dar coerência e amplitude a paisagens que, vistas de outro modo, não teriam por vezes a magnificência que depois adquirem.
Quando digo varandas digo também mirantes, porque colocados em sítios altos nos oferecem quadros que jamais esqueceremos.
Conheço duas varandas espectaculares, felizmente de amigos, o que me dá a hipótese de desfrutá-las de vez em quando.
Uma sobre o Tejo. Do 10º andar o nosso olhar deleita-se sobre uma larga baía bordejada de casario. À tarde, as diversas cambiantes de azul alternam-se progressivamente até que o manto de estrelas se desdobre no horizonte e cubra toda a terra.
Outra, sobre o mar. Já falei dela antes - verdadeiro quadro vivo que não me importaria de possuir.
Depois, há as varandas sobre as cidades - os miradouros - e as outras sobre os vales.
Na Lisboa da minha adolescência, Santa Luzia, à qual não voltei, e de que guardo uma imagem de azulejos amarelos e azuis debruçada sobre a cidade. Sobre o muro em que me apoiava, arcos bordados de verde ofereciam uma sombra protectora. Já nessa altura gostava de me refugiar nestes locais, em fins de tarde amenos ou em manhãs soalheiras e luminosas.
Sobre os rios, estas varandas privilegiadas permitem-nos seguir o seu traçado sinuoso e perdermo-nos no seu leito cravado na paisagem.
Do alto de um miradouro vemos a geometria dos canteiros que alguém traçou na planura, parece que com a precisão de régua e esquadro, percebendo-se os seus limites pela alternância dos verdes. Da cidade velha de baixo casario destacam-se aqui e ali as torres das igrejas, vigias da planície - enquanto que o majestoso Tejo desliza vagaroso por um leito traçado desde há muito.
De uma outra varanda guardo uma imagem viva - uma que protege o vale e enfrenta a serra. Em baixo serpenteia o Mondego por entre abrupta paisagem, enquanto os mortos velam no seu ninho o seu passar preguiçoso. Aqui o tempo parou, todo o ruído engolido pelo chilrear cuidadoso da passarada. A paisagem suspensa de um olhar que se quer eterno.
Varandas. Poleiros em que nós, simples mortais, podemos poisar e levantar voo em pensamento.

14 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Das Varandas e Mirantes trataremos um destes dias. Em fotos

1:32 da tarde  
Blogger Maria Carvalho said...

Sem dúvida. Beijos.

3:45 da tarde  
Blogger saisminerais said...

Uma varanda que aqui descreves é-me muito familiar... As outras é claro que consigo imaginar.
Miratagus?
ok beijinhos e deixa-me dizer-te que descreves os lugares de tal forma que´se tornam autenticos convites publicitários para quem ama a natureza, para quem ama o que de bom tem o nosso país, nostalgia sem limites é só o que te digo...

5:19 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Não são varandas, são serpentes sobre o Mondego.Ou, então, mulheres.

6:48 da tarde  
Blogger Claudinha ੴ said...

Me deu saudades da minha distante Ouro Preto, onde eu namorava na varanda da casa grande, com azulejos portugueses na metade da parede, uma hera envolvendo o gradeado e eu lá, menina moça sonhando em alçar meus vôos...
Aqueles beijos não voltam mais, nem aquela lua e aquele olhar, e nem eu quero, ficaram para sempre em minhas lembranças que você despertou com este seu belíssimo texto!
Beijo!

7:50 da tarde  
Blogger Concha Pelayo/ AICA (de la Asociación Internacional de Críticos de Arte) said...

Oh, Dulce. Qué bellas descripciones haces de tus paisajes. Has conseguido que me transporte a esos lugares.

Un beso amiga.

11:28 da tarde  
Blogger por um fio said...

Benvinda ao nosso jogo!
Espreitei e também gostei muito do que vi.
Temos causas em comum, as mansardas, o Tejo visto das mansardas...

12:27 da manhã  
Blogger Paulo said...

«Varandas»...da minha varanda vejo as searas cor de ouro porque é Verão. Uma ou outra cigarra passa apressada e, à noitinha a minha janela/varanda é a plataforma dos meus sonhos, dos meus lugares de ausências..enfim..da minha anologia sentimental. Lembro-me de quando eu era pequenino e a minha mãe dizia: "olha a janela/varanda", "cuidado com a janela"...Agora, 25 anos depois, ainda parece ouvir a minha mãe lá do céu: "filho, não caias da janela/varanda". Aqui nasci..e sempre a mesma janela/varanda. A minha janela7varanda virada para a secura da planicei..a minha confidente..e, por vezes, a minha amada.

Obrigado, janela/varanda!!!!

Obrigado por ter este blog.
bjs
Paulo

1:08 da manhã  
Blogger o alquimista said...

Foi tão bonito ver pelos teus olhos toda a beleza que descreveste...

Beijo

10:50 da manhã  
Blogger João C. Santos said...

Fechei os olhos li o teu texto com a alma...

Um beijo de boa tarde e uma boa semana...

11:11 da manhã  
Blogger wind said...

É isso mesmo que escreveste:)
beijos

3:06 da tarde  
Blogger Agreste said...

como se uma janela não bastasse, como se estivesse parada no ar, um pouco abaixo das nuvens, ao alcance do voo dos pássaros...
não pendures lá a roupa ok???!!!

9:25 da manhã  
Blogger Diafragma said...

Muito interessante. Vou passar a olhar para as varandas com outros olhos.

11:52 da manhã  
Blogger Diafragma said...

p.s.: a tua foto para o Fotodicionário é um espectáculo!

11:53 da manhã  

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