segunda-feira, outubro 24, 2005

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"Eu gostava na verdade, de ter língua, mas uma língua forte e simples, desafectada, impulsiva, verdadeira, uma língua expressiva e sincera (...) eu gostava de ser senhora de uma língua que fosse um látego para os meus estados de espírito, que firmemente os retalhasse! Falaria hoje, e talvez sempre, da minha inquietação ... Não é um estado moral simples, é um estado enervado e de desacomodação!
Falaria também, se pudesse, dos confusos desejos e das imprevistas ansiedades que de súbito se abatem sobre nós e nos derrotam! Do vácuo sentimental e das nossas íntimas, profundas impressões de desaire..,
Mas como? É infantil querer tornar os sentimentos claros. Os romancistas é que pretendem justificar sempre as crises morais. No entanto, não me parece que a língua dos romancistas, dos analistas dos sentimentos, seja alguma vez capaz de dar o verdadeiro enervamento, de se adequar a ele. A língua do enervamento, se realmente existisse, devia ser bem confusa, inextricável e intransmissível."

LISBOA, Irene, "Solidão", Círculo de Leitores, LIsboa, 1973, p.10,11

3 Comments:

Blogger wind said...

"que a voz nunca se cale" :)

11:38 da tarde  
Blogger Maria Carvalho said...

Gostei muito! As línguas não podem calar-se, as bocas não podem fechar-se. Beijos

7:59 da manhã  
Blogger Su said...

amei ler
jocas maradas

7:48 da tarde  

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